ALICE
DE OLIVEIRA COSTA, filha de Flamínio Antonio Costa
e Eulina de Oliveira Costa, nasceu em Salvador em 05 de
fevereiro de 1911, no seio de uma família numerosa.
Perdeu a mãe muito jovem e o pai dedicou-se integralmente
à educação dos filhos, procurando preencher
a ausência materna. A convivência com muitos
irmãos e a necessidade de ajuda mútua moldou,
em sua percepção, um traço do seu caráter
- a cooperação. Mas esse não foi o
único aspecto relevante da sua personalidade, era
apenas o do seu auto-reconhecimento. Os que com ela conviveram
percebiam o profundo senso de justiça, a lealdade
e a perseverança no agir cotidiano como as marcas
do seu modo de ser. Muito cedo revelou suas aptidões
intelectuais e desenvolveu o gosto pela leitura e pela aprendizagem
de idiomas. Com determinação, aprendeu em
casa, quase sem ajuda, a língua francesa.
Ingressou
na Faculdade de Filosofia da Bahia, hoje Faculdade de Filosofia
da Universidade Federal da Bahia, em 15 de março
de 1943, ano do início das atividades dessa instituição,
para cursar Pedagogia, fazendo parte, portanto, da primeira
turma que concluiria o bacharelado em 05 de dezembro de
1945. Neste dia a Faculdade de Filosofia, com a paraninfia
de Isaias Alves, entregou à sociedade baiana os primeiros
bacharéis, formados em sua terra, em letras, pedagogia,
filosofia, matemática, geografia e história
e ciências sociais. A licenciatura seria concluída
no ano seguinte.
Na Faculdade
de Filosofia, cursando Pedagogia, nasce o seu maior interesse
- a Psicologia e suas aplicações à
educação. É nesse período que
dirige a sua curiosidade intelectual para o trabalho de
Helena Antipoff, psicóloga russa que a convite do
governo de Minas Gerais havia se transferido para o Brasil,
em 1929, e lá desenvolvia amplo trabalho na área
da Psicologia Educacional com a criação do
Laboratório de Psicologia Aplicada na Escola de Aperfeiçoamento
de Professores de Minas Gerais e com a instalação,
em 1932, da Sociedade Pestalozzi de Minas Gerais.
De 1944 a 1949, Helena Antipoff trabalhou no Ministério
da Educação e Saúde tendo importante
participação na institucionalização
do Departamento Nacional da Criança e da Sociedade
Pestalozzi do Brasil. Visita Salvador e busca o apoio do
governo do Estado para a sua empreitada que era a disseminação
de instituições para o atendimento de crianças
excepcionais. A resposta que obtém do interventor
Pedro Aleixo é a de que o Estado não tinha
recursos nem para cuidar dos normais, quanto mais dos anormais.
Tem Alice sua primeira grande decepção e,
talvez, a partir desse fato, desenvolvido certo ceticismo
com relação às ações
governamentais.
Recém-graduada
em Pedagogia e com os interesses profissionais claramente
definidos pela Psicologia, viaja em 1947 para a França,
e em Paris, na Sorbonne, realiza seus estudos de pós-graduação.
Lá consolida a sua formação acadêmica
com o aprofundamento das concepções e influências
que marcariam a sua trajetória profissional.
Na Sorbonne, torna-se aluna de Henri Wallon, então
grande pesquisador na área de Psicologia do Desenvolvimento
e político atuante na educação. Aprofunda-se
na concepção do desenvolvimento cognitivo
do professor Wallon que há pouco (1945) havia publicado
a sua obra mais importante "Les origines de la pensée
chez l'enfant" (As origens do pensamento na criança).
É sob essa influência que Alice desenvolve
uma atitude crítica a qualquer concepção
reducionista, tanto na Psicologia, quanto na percepção
do mundo. Abre-se às influências da psicanálise
e amplia seus horizontes na concepção do desenvolvimento
cognitivo e afetivo da criança e do adolescente.
É a partir dos estudos de Wallon que compreende o
desenvolvimento do pensamento como resultado das interações
dos fatores orgânicos com as influências sócio-culturais,
amplia os seus estudos para a psicanálise e para
a concepção do desenvolvimento cognitivo de
Piaget. A psicanálise para compreender os conceitos
de emoção e afetividade e Piaget para entender
a evolução cognitiva, numa mesma linha interacionista,
como Wallon propunha. A síntese dessas concepções
- Wallon, Piaget e Freud consolidam a sua formação
teórica.
Além da formação teórica, Wallon
lhe proporciona a descoberta de uma bem sucedida ação
política na educação. É com
entusiasmo que acompanha o resultado da atuação
dele como Secretário da Educação Nacional
e como presidente da comissão de reforma educacional
do pós-guerra. O trabalho dessa comissão,
iniciado ainda nos porões da resistência francesa
ao invasor nazista, o Plano Langevin-Wallon, foi elaborado
para a França do pós-guerra e tinha como objetivo
a reconstrução da França democrática
depois da 2ª grande guerra. A reforma altera profundamente
o ensino francês até então dicotomizado
entre os que podiam ter acesso à universidade e os
que concluíam o ensino técnico e nesta condição
permaneciam por terem o acesso impedido pela não
equivalência dos cursos secundários. A instauração
de um tronco comum assinala a democratização
do ensino. As alterações propostas garantem
que o primeiro e mais importante dos princípios do
Plano seja assegurado ou seja, o princípio da justiça,
da igualdade de oportunidades. Acompanha o desenrolar dessas
ações vitoriosas que servem de contraponto
ao momento de descrédito vivido durante a sua graduação.
Em Paris,
entra também em contato com o trabalho de René
Zazzo, assistente de Wallon no Centro Nacional de Pesquisa
Científica - CNRS. Havia, então, Zazzo, sob
a orientação de Wallon, obtido uma bolsa de
estudos para o laboratório de Gesell na Universidade
de Yale, onde se especializou em psicologia da criança.
Ao retornar de Yale, Zazzo publica, em 1942, o seu primeiro
livro sobre os pioneiros da psicologia americana "Psychologues
e Psychologies d'Amériques" e, como Wallon,
também ingressa na Resistência.
Em 1945, por solicitação de Wallon, Zazzo
funda os primeiros serviços de psicologia escolar,
reforçando a tradição francesa, que
remonta a Binet, de aplicação da psicologia
na educação e, cumprindo um dos princípios
do Plano Langevin-Wallon, o da orientação
escolar e profissional. Zazzo tornou-se uma grande influência
na formação teórica de Alice com a
sua fundamentação do trabalho de orientação
escolar (sistematizada na obra "Psychologie Scolaire"
de 1953) e na prática da orientação
profissional.
Ao retornar
de Paris, Alice inicia sua vida profissional, no final de
1948, como assistente do professor de Administração
Escolar e Educação Comparada na Faculdade
de Filosofia, sem vínculo formal, como acontecia,
naqueles tempos, com quase todos os professores em início
de carreira.
Em março
de 1950 assume a cadeira de Psicologia Educacional, na mesma
Faculdade, e a portaria de nomeação, conforme
a burocracia da época, somente ocorre em 11 de julho
de 1952, com efeito retroativo a 1950.
Na Faculdade
de Filosofia dedica-se, primordialmente, ao Curso de Pedagogia,
lecionando Psicologia Educacional no 3º ano direcionando
a disciplina para a Psicologia Diferencial e, no 4º
ano, para a orientação educacional e vocacional.
Nas duas disciplinas, a sólida formação
conquistada na França, o afinco com que se dedicava
aos estudos e o interesse permanente pelos avanços
da psicologia no mundo, transformavam o seu trabalho no
maior diferencial na formação dos pedagogos
da Faculdade de Filosofia. Exigente com a diversificação
bibliográfica, não admitia que as respostas
às questões de suas provas revelassem a utilização
das mesmas fontes bibliográficas. Cobrava dos alunos
a busca de fontes diversas para a resolução
das questões propostas.
Apesar
de não ser um requisito formal do Curso de Pedagogia,
orientava, como trabalho final do 4º ano, a realização
de uma pesquisa com todo o rigor metodológico que
se podia exigir dos graduandos. Esse era o grande momento
do curso, tanto pelo que resultava em aprendizagem, quanto
pelos vínculos afetivos que se consolidavam entre
os colegas e entre ela e seus discípulos. O trabalho
de investigação científica, individual,
com tema escolhido conforme o interesse pessoal se definia
no início do ano, para que todas as etapas da investigação
pudessem ser cumpridas. Ao longo do segundo semestre, com
os dados já coletados pelos alunos, reunia-os em
seu apartamento, à noite e aos sábados para
orientação individual que resultava, também,
num momento de aprendizagem coletiva. Aprendia-se com o
desenvolvimento do trabalho do outro. Esses encontros terminavam
com uma demonstração das habilidades culinárias
de Alice, motivo de grande orgulho para ela, quando servia
a seus alunos o lanche que encerrava o trabalho do dia.
Tiveram o privilégio de viver essa experiência,
os que, nos anos sessenta, integravam as pequenas turmas
do curso de Pedagogia.
Nos
anos de 1952 e 1953 encontra no SENAC - Serviço Nacional
de Aprendizagem Comercial - o espaço de trabalho
que vai definir, por toda a sua vida, o interesse pela orientação
vocacional. Nesse período, torna-se estagiária
do Departamento Nacional do SENAC, na Bahia. Em 02 de janeiro
de 1954 ingressa nos seus quadros como Conselheira de Orientação
Profissional, marcando sua passagem nesta Instituição
pela dedicação, zelo e competência no
exercício da supervisão, orientação
e coordenação de todas as atividades do Setor
de Orientação Educativa e Profissional. Realiza
e supervisiona as pesquisas nesta área promovidas
pelo SENAC. No exercício dessa atividade mantém
importantes contatos com outros pesquisadores, com destaque
para o professor Pierre Weil, diretor do Departamento de
Pedagogia e Orientação Profissional, da mesma
instituição, no Rio de Janeiro, no período
de 1949 a 1958. Acompanha o desenvolvimento do trabalho
desse ilustre pesquisador que resultou no Teste INV (Inteligência
não Verbal) e sua aplicação à
população brasileira e manteve com ele relações
profissionais e de amizade durante toda a sua vida. Seu
afastamento somente ocorre, quando novas atribuições
lhe são confiadas na Universidade Federal da Bahia.
Mas, no final de sua vida profissional, retorna ao SENAC
e chega a assumir a Diretoria da Divisão de Formação
Profissional e com essa ascensão profissional consolida
brilhantemente a sua passagem por essa Instituição
que se encerra em 06 de julho de 1979.
O ano de 1955 foi de intensa atividade para Alice. De 11
a 25 de abril participa do Seminário Latino Americano
de Psicotécnica e da Semana de Orientação
Profissional no Rio de Janeiro. Mantém contatos e
conhece de perto o trabalho que então se desenvolvia
no ISOP - Instituto Superior de Orientação
Profissional da Fundação Getúlio Vargas
- dirigido pelo Dr. Emílio Mira y Lopez. A participação
nesse seminário e o encontro com o professor Mira
y López vão ser de fundamental importância
para a criação de um centro de orientação
vocacional na Bahia. Viaja para o Uruguai e a Argentina,
em busca do aprofundamento dos estudos em orientação
escolar e em orientação vocacional e profissional,
visitando centros dirigidos a essas atividades. Complementa,
desse modo, estudos que haviam sido intensificados no ano
anterior, quando realizou estágios no sul do país.
Em 1957
retorna à Argentina para uma nova temporada de atualização.
No final
dos anos 50, surgem no Brasil, os Colégios de Aplicação,
inicialmente implantados na Faculdade Nacional de Filosofia
do Rio de Janeiro, em 1948, e na Faculdade de Filosofia
da UFBA, em 1949. Essa experiência representa um sopro
inovador no ensino secundário público com
a modernização do ensino da matemática,
da língua portuguesa e das demais disciplinas do
currículo. Funcionavam como centros de treinamento
didático dos licenciandos, isto é, dos futuros
professores secundários formados pelas faculdades
de filosofia. O ensino no Colégio de Aplicação
da Faculdade de Filosofia da Universidade Federal da Bahia
alcançou uma qualidade excepcional e se tornou uma
referência em inovação, tanto para a
rede pública, quanto para a rede privada de ensino
secundário. Durante a gestão da professora
Leda Jesuíno (1958-1964) o Colégio da Aplicação,
prosseguindo em sua trajetória inovadora, estrutura
dois serviços técnicos específicos:
a Coordenação Pedagógica (COP) e o
Serviço de Orientação Educacional (SOE).
Alice Costa é então convidada pela Diretora
para, na condição de psicóloga, dirigir
o SOE. O credenciamento como psicóloga havia sido
pioneiramente concedido pelo Ministério da Educação
e da Cultura pelos serviços prestados na área,
no exercício da atividade clínica, em Salvador.
Nessa atividade, marcada pelo pioneirismo, direciona sua
ação para o acompanhamento dos alunos em seu
desenvolvimento afetivo, cognitivo e comportamental, apoiando-os
na melhoria do seu rendimento escolar. Mas, centra também
a sua atuação no desenvolvimento das relações
interpessoais do aluno com seus colegas, professores, no
diálogo com os pais e na assistência psicológica
à escolha vocacional. Para tanto, os estudos de pós-graduação
realizados na Sorbonne, especialmente os ministrados por
Zazzo, encontram campo fértil para a sua aplicação.
Os progressos do Colégio de Aplicação
nesses dois domínios influenciam outros estabelecimentos
de ensino médio que terminam por instalar em suas
dependências os serviços de orientação
educacional e de coordenação pedagógica,
tendo como referência o SOE e a COP do Aplicação.
A participação,
em 1955, no Seminário Latino Americano de Psicotécnica
e na Semana de Orientação Profissional no
Rio de Janeiro lhe oportunizou o encontro com Dr. Emilio
Mira y López, considerado internacionalmente a figura
de maior destaque no âmbito da psiquiatria, psicologia
e psicotécnica hispano-americana do século
XX. Mira y López era espanhol e após o fim
da guerra civil espanhola, em 1939, se exilou na França
e acabou por se instalar na Argentina em 1940, daí
expandindo sua atuação por vários países
da América Latina. Depois de inúmeras viagens
ao Brasil para proferir palestras e ministrar cursos, inclusive
na recém-criada Faculdade de Filosofia da Bahia,
termina por se mudar para o Rio de Janeiro para, na Fundação
Getúlio Vargas, ocupar o cargo de diretor fundador
do Instituto de Orientação Profissional do
Rio de Janeiro - ISOP, em 1946, exatamente quando percebeu
que não mais poderia retornar a sua terra natal com
a vitória do franquismo. Esse grande especialista
em orientação vocacional não limitou
a sua atuação ao Rio de Janeiro e procurou
amplia-la por outros estados brasileiros, inclusive a Bahia.
Vivia a Universidade Federal da Bahia na década de
50 um período de grande efervescência sob o
reitorado de Edgard Santos e neste ambiente favorável
foi criado, em 1958, o Instituto de Orientação
Vocacional. E como resultado da atuação amplamente
reconhecida, em seus primórdios, o IDOV teve como
orientador científico o Dr. Emilio Mira y López
e na função de vice-diretora Alice Costa.
Esta parceria possibilitou ao Instituto a realização
de trabalhos da mais alta relevância na área
da orientação vocacional e profissional e
no desenvolvimento da psicotécnica. O primeiro deles
foi o Projeto de Aplicação e Validação
de Testes de Inteligência e Questionário de
Interesses Profissionais realizado nas escolas de Salvador
e área metropolitana, tendo Alice Costa como coordenadora
dos alunos dos cursos de Pedagogia, Filosofia e Estatística,
partícipes do Projeto. Para o desenvolvimento desse
trabalho a experiência levada a cabo pelo professor
Pierre Weil, com a Pesquisa sobre o Nível Mental
da População Brasileira, foi uma referência
valiosa para ela.
Em 05 de agosto de 1961, Alice de Oliveira Costa foi nomeada,
pelo então reitor Albérico Fraga, diretora
do IDOV exercendo essa função até 27
de janeiro de 1966. Transforma o IDOV num centro de referência,
acolhendo os jovens que desejavam encontrar uma ajuda especializada
na escolha da carreira profissional, como também
num centro de investigação e discussão
dos problemas e progressos da Psicologia no mundo. Pesquisadores
de renome nacional e internacional por lá passaram.
Ávida
por novos saberes e com uma inquietante e permanente curiosidade
intelectual, em 1966, aos cinqüenta e cinco anos de
idade, quando as mulheres de sua geração acreditavam-se
velhas, retorna à França para uma nova temporada
de estudos. Hospeda-se nos dois primeiros meses com o casal
Waldir e Iolanda Pires, então exilados, no subúrbio
norte de Paris. Em seu retorno proporciona aos alunos e
ex-alunos, além das novidades científicas,
impressões sobre as transformações
operadas na Europa, sobre os movimentos artísticos
e culturais e sobre a situação dos exilados
brasileiros que lá se encontravam. As observações,
sobre tudo o que vira, eram únicas, extraordinariamente
ricas e originais, distantes de qualquer rigidez ou armadura
ideológica, como costumavam ser as análises
do período. Em síntese, traduziam a sua personalidade
aberta ao mundo, livre dos estereótipos e dos preconceitos.
A partir
de fevereiro de 1968, com a reestruturação
da Universidade Federal da Bahia segundo a Reforma Universitária,
o Departamento de Pedagogia e o Colégio de Aplicação
da antiga Faculdade de Filosofia Ciências e Letras
passam a integrar uma nova unidade de ensino e pesquisa
a Faculdade de Educação. Em 1969, a FACED
se instala com inúmeros desafios a responder. Alice
se engaja na resolução dos problemas que a
reformulação do curso de Pedagogia ensejou,
qual seja a de consolidar a formação dos pedagogos
através das novas habilitações em Supervisão
Escolar, Orientação Educacional, Administração
Escolar e Magistério das Matérias Pedagógicas.
Responsável pela disciplina Orientação
Vocacional, integra-se ao Núcleo de Orientação
Educacional e com Maria Augusta Abdon desenvolve um importante
trabalho que, com justiça, se poderia afirmar ter
sido o período áureo da Orientação
Educacional na Bahia. Maria Augusta cria e preside a Associação
de Orientadores Educacionais da Bahia, vinculando-a a Federação
Nacional de Orientadores Educacionais, e desenvolve com
o apoio de Alice um trabalho extraordinário que ultrapassa
o âmbito da Faculdade de Educação da
Ufba ao envolver os cursos de Pedagogia da Universidade
Católica de Salvador e da Faculdade de Educação
da Bahia. São realizados inúmeros Encontros
e Congressos de Orientação Educacional de
caráter estadual e um encontro anual de estagiários
de orientação educacional. Nesses encontros
anuais de estagiários o alto nível dos trabalhos
apresentados eram, sem dúvida, o resultado da meticulosa
orientação de Alice e de Maria Augusta.
Sempre
aberta à participação em experiências
inovadoras, foi convocada por Zahidé Machado Neto
e Joselice Macedo de Barreiros, em 1968, para participar
da realização do primeiro vestibular da Faculdade
Estadual de Educação de Feira de Santana,
a primeira faculdade voltada para a formação
de professores que o Estado da Bahia implantou, em seu processo
de interiorização do ensino superior. Esse
vestibular buscou inovar o processo de seleção
dos alunos, através de provas que avaliavam mais
as competências necessárias aos estudos de
nível superior do que os conteúdos exigidos
nos vestibulares tradicionais. Para complementar esses instrumentos,
foi introduzida uma etapa de "avaliação
psicológica" dos candidatos composta da aplicação
de testes psicológicos de habilidades cognitivas,
interesses vocacionais e uma entrevista para conhecimento
dos candidatos. A coordenação dessa etapa
esteve a cargo de Alice Costa com a participação
de Yara Maria Cunha Pires, sua discípula e professora
de Psicologia da nova Instituição. Essa avaliação
tinha por objetivo conhecer os candidatos e ajudar a nova
instituição no desenvolvimento de suas atividades.
Essa inovação só ocorreu no primeiro
e no segundo vestibular e inviabilizou-se nos posteriores,
com a ampliação do número de concorrentes.
A aposentadoria
compulsória em 06 de fevereiro de 1981 não
encerrou, nem diminuiu a atividade intelectual de Alice.
Até o final de sua vida manteve-se atualizada com
os progressos da psicologia, estudando os temas mais em
voga, aprendendo o alemão e antenada com o mundo.
E, finalmente,
um testemunho de alguém que teve a oportunidade de
usufruir da condição de aluna e o privilégio
de conviver para além da sala de aula com dona Alice:
foi uma mulher de qualidades excepcionais, como profissional
e como pessoa, muito à frente das mulheres do seu
tempo. Viveu em sua plenitude o século XX com suas
contradições, divisões e transformações.
Na vida acadêmica conviveu com a dicotomia ideológica
que a dividia entre direita e esquerda, marxismo e liberalismo
e outras dicromáticas formas de ver e explicar o
mundo. Sabiamente interagiu com posições divergentes,
do marxista Henri Wallon ao espiritualista e ideólogo
da paz Pierre Weil, absorvendo as lições desses
e de outros destacados psicólogos como Mira y López
e René Zazzo. Como fruto de tão significativas
influências desenvolveu, num mundo polarizado, no
qual predominava apenas a visão de duas cores, um
olhar matizado, uma percepção refinada, onde
o amplo espectro das cores se tornava possível. Transitou
com leveza entre as diversas correntes psicológicas
e viveu em tão alta sintonia com a Psicologia que
se despediu da vida, em 1996, de forma emblemática,
na data em que se comemora o dia do psicólogo - 27
de agosto.
Por essas razões, Alice de Oliveira Costa marcou
a sua passagem como uma grande educadora e psicóloga
da Bahia e, pela riqueza de suas contribuições,
a Academia de Educação de Feira de Santana
a reverencia com a cadeira de número 1.
Yara
Maria Cunha Pires é membro fundador da Academia de
Educação de Feira de Santana, ocupando a cadeira
de n.1, cujo patrono é Alice de Oliveira Costa.